“A notícia da morte de nosso pai irá tocá-lo tanto quanto tocou a mim. Estávamos os dois destinados a chorá-lo de longe.” (Auguste Hahnemann, irmão)
Em 1783, aos 28 anos, nasce sua primeira filha, chamada Henrietta como a mãe, ainda em Gommern. O afeto de Hahnemann por sua filhinha era muito grande, e para ela compôs uma canção de ninar:
“Durma filha, suavemente!
O passarinho amarelo canta no bosque;
Levemente ele pula sobre a neve e o gelo,
E dorme quieto nos galhos secos
– suavemente ele dorme.”
Em 1784, aos 29 anos, publica seu primeiro artigo criticando os médicos, chamado “Guia para curar profundamente as feridas antigas e as úlceras pútridas”. Nele, critica a sistemática cauterização cirúrgica das feridas. O artigo continha extensas referências à necessidade de medidas de higiene, que eram desconhecidas à época, e à importância de exercícios físicos. Termina o artigo afirmando que os pacientes ficariam melhor se não tivessem a assistência de um médico. Publica também alguns artigos médicos, condenando o uso de emplastros de chumbo ou de mercúrio, denunciando sua toxicidade. Em outros critica o abuso do álcool e do café, este último com muita veemência. Suas publicações são muito bem aceitas pelo meio médico, como atesta um elogio de um editor de um jornal médico, o Professor Baldinger: “O autor trata seu tema a fundo, corretamente. Mostra o lado nocivo dos tratamentos habituais e sugere melhores soluções.”
Neste ano, mudam-se para Dresden, que era uma cidade importante, a estadia preferida dos reis da Saxônia, era considerada a Florença do Elba. Lá recebe a notícia de que seu pai morrera, por uma carta de seu irmão mais novo, Auguste, que se tornara farmacêutico. “A notícia da morte de nosso pai irá tocá-lo tanto quanto tocou a mim. Estávamos os dois destinados a chorá-lo de longe.” Seu pai trabalhara até a morte aos 66 anos, como pintor de porcelana, mesmo com a visão muito enfraquecida. Foi enterrado em Meissen. Hahnemann escreveu em sua autobiografia: “Soube sempre distinguir entre o bem e o mal com tanta fineza e delicadeza, com tanta retidão, que isso foi para mim uma grande lição. Foi meu mestre. Sua concepção da origem do universo, da dignidade do homem e do seu destino marcava cada ato de sua existência. Eis aqui definido o verdadeiro fundamento da minha conduta moral.”
Hahnemann permanecerá em Dresden por 4 anos. Lá também atrai poucos clientes, contudo tem intensas atividades intelectuais e científicas. Através da Maçonaria, torna-se amigo do médico-chefe dos serviços públicos da cidade, o Dr. Wagner, que lhe pede para substituí-lo durante um ano em que esteve doente (31 anos). Assim, Hahnemann familiariza-se com os hospitais da cidade e interessa-se pelas questões de higiene da cidade. Passa a trabalhar como médico das prisões e médico legista. Conhece Lavoisier neste período, quando este visita Dresden.
Um outro amigo maçom, o conselheiro Adelung, chefe da Biblioteca do Príncipe, abre-lhe as portas da grande biblioteca da cidade. Neste período, Hahnemann escreve obras originais e realiza traduções, quais sejam:
Em 1786, aos 31 anos, escreve “Sobre o envenenamento pelo arsênico, seu tratamento e sua constatação do ponto de vista legal”.
Em 1787, aos 32 anos, traduz um livro do farmacêutico belga Van den Sande, sobre pureza e adulteração de substâncias químicas, ao qual adiciona tantas informações derivadas de suas experiências químicas, que praticamente é um novo livro. Escreve “Critérios de pureza e de falsificação dos medicamentos”. Escreve sozinho 2 livros: “Dissertação sobre os preconceitos contra o aquecimento pelo carvão de terra. Como melhorar este combustível e sua utilização no aquecimento dos fornos” e “Sobre as dificuldades de preparar o álcali mineral pelo potássio e o sal marinho.”
Em 1788, aos 33 anos, escreve 4 obras: “Da influência de alguns gases na fermentação do vinho”, “Sobre os meios de detectar o ferro e o chumbo no vinho” (cujo método é utilizado até hoje para detecção de adulteração nos vinho para torná-lo mais doce), “Sobre a bile e os cálculos biliares”, “Sobre um meio eficaz de deter o processo de putrefação” (este último foi traduzido para o francês no ano seguinte e publicado em Paris no Jornal de Medicina.
Em 1789, aos 34 anos, publica um artigo sobre “Modo exato de preparação do mercúrio solúvel.”
Em 1790, aos 35 anos, outro artigo, “Exposição completa sobre a maneira de preparar o mercúrio solúvel”.
Estes livros e artigos tornam Hahnemann conhecido e respeitado na Alemanha e na Europa, mas trazem-lhe também inimigos. O trabalho sobre a toxicidade do arsênico leva à interdição dos remédios à base de arsênico, que eram tão usados para malária à época. Nesta obra, ele foi muito veemente, mostrando-se indignado contra “o degradante comércio de receitas que ofendem a terapêutica, essa ciência imitada de Deus.” Estes trabalhos demonstram a preocupação constante de Hahnemann com adulteração de substâncias, e esta preocupação seria a causa de sua eterna briga com os farmacêuticos. Os médicos, ele também os considerava cruéis, inescrupulosos e gananciosos, além de mancomunados com os farmacêuticos. Neste período, o interesse de Hahnemann é muito voltado para a química.
Já o mercúrio solúvel foi elaborado por Hahnemann no laboratório de seu sogro Häseler, em Dessau.
Enquanto escrevia esses livros, encontrou tempo para traduzir do inglês para o alemão o livro “História de Abelardo e Heloísa”, do inglês Barington, uma obra eminentemente romântica.
Aos 33 anos, nasce seu filho Frederico. A situação financeira continua difícil, sobrevive com os poucos clientes e o dinheiro ganho com traduções e publicações de seus livros. Em 1788, aos 33 anos, seu amigo Dr. Wagner, mal recuperado de sua doença, morre e Hahnemann concorre à sua sucessão, contudo é preterido pelo Dr. Eckhardt, mais velho e residente há longo tempo na cidade. Um ano depois o Dr. Eckhardt falece, mas Hahnemann decide não concorrer à sua vaga, acreditando que suas chances são mínimas.
Decide então deixar Dresden e mudam-se para Leipzig, aos 34 anos, após o nascimento de uma segunda filha, Guilhermina. Seus filhos, como ele próprio em sua infância, têm a saúde delicada, o que piora a situação financeira. Henrietta tricotava praticamente todas as roupas da família. Leipzig era uma próspera cidade industrial, com uma vida médica intensa, e chegam à cidade em 28 de setembro de 1789, dia de São Miguel.
O ano de 1789 foi marcado pela Revolução Francesa, que afetaria todo o continente europeu. E Leipzig era uma importante cidade da Europa Central, constituindo um centro econômico e cultural de monta. Era conhecida como “a cidade do livro”. Hahnemann reencontra sua primeira faculdade, que deixara há 13 anos, e torna-se assíduo freqüentador de sua biblioteca.