Em 1797, aos 42 anos, muda-se novamente, desta vez para Königslutter, onde residirá por dois anos. Fica sabendo que o posto de médico pessoal do duque Ernesto, de Gotha, está vago e usa a influência de seu amigo maçom, o conselheiro Becker, para obtê-lo, mas o duque responde negativamente de forma ríspida. Sua reputação como médico está crescendo, e muitos pacientes vêm procurá-lo de longe, mas muitos o procuram por saberem que ele não cobra pelos remédios. Os médicos de Königslutter, invejosos de sua crescente fama, incitam os farmacêuticos a abrirem um processo contra Hahnemann por dispensar medicamentos, o que é uma prerrogativa das farmácias. Hahnemann fica proibido de preparar seus próprios remédios e ele tem que encaminhar seus pacientes para os farmacêuticos, em quem ele não confia nem um pouco.
Em 1799, aos 44 anos, muda-se para Altona, a 20 quilômetros de Hamburgo, um lugar sofisticado. Já é bastante conhecido dos médicos e do grande público, e seu nome suscita polêmicas, as pessoas ou gostam dele e de suas idéias ou o odeiam, ninguém fica indiferente. Recebe muitas cartas, algumas de insultos, mas a maioria de pessoas solicitando sua opinião e conselho sobre algum doente. De início, Hahnemann sente-se lisonjeado, mas depois incomoda-se muito com estes pedintes de consultas gratuitas. Publica então um anúncio no jornal local:
“Caro público!
Quase não dá para acreditar que haja tanta gente que pense que, só porque sou uma figura privada, tenho tanto tempo livre para que me atazanem a vida com repetidas cartas que nem vêm franqueadas e que tenho eu próprio de pagar. Essas cartas pedem-me opiniões médicas delicadas. Sou obrigado a dedicar-lhes um esforço intelectual e uma parte do meu tempo, que é precioso. Nunca passaria pela cabeça desses indelicados correspondentes enviar-me a mínima remuneração.
Para frear a onda sempre crescente desta correspondência, informo-vos do seguinte:
ñ de futuro, passarei a recusar qualquer carta sem franquia.
ñ Só responderei a quem pedir minha opinião se a carta vier acompanhada de um honorário suficiente, pelo menos uma moeda de ouro, a não ser que a pobreza do meu interlocutor seja tal que não lhe permita esta despesa. Se assim não fosse, estaria pecando contra a humanidade, o que não quero fazer.
ñ Finalmente, se me enviarem bilhetes de loteria como forma de pagamento, irei devolvê-los à custa do remetente.
Assinado: Samuel Hahnemann, médico, Altona por Hamburgo, 9 de novembro de 1799.”
O jornal teve sua seção de cartas dos leitores invadida por inúmeros protestos de médicos e leigos, indignados pelo tom violento do anúncio de Hahnemann, e sua popularidade no local ficou seriamente ameaçada.
Neste mesmo ano, o seu amigo, o Conselheiro Becker, envia-lhe um paciente que sofre de distúrbios mentais, acreditando que é Deus, para que seja internado em sua casa em Altona e receber um tratamento melhor. Chamava-se Johann Karl Wezel, e era um famoso autor de teatro austríaco, muito apreciado pelo público e pelo imperador José II. Após duas semanas, Hahnemann pede a seu amigo que venha retirá-lo, pois ele come demais, e a Sra. Hahnemann não dava conta de alimentá-lo, causando um prejuízo muito grande. Esta decisão causa uma má impressão junto ao público, até na corte de Viena. Muda-se para Hamburgo, mas vai passar poucos meses aí, devido ao altíssimo custo de vida, agravado pela inflação e escassez causados pela guerra.
A pobreza continua, há um acúmulo de dívidas, Hahnemann sai em 1800, aos 45 anos, para outra pequena cidade perto de Hamburgo, chamada São Jorge, e neste mesmo ano muda-se para Mölln, e depois para Lubeck. Junto à miséria, cresce a intransigência de Hahnemann. Em Mölln Hahnemann e Henrietta vêem pela primeira (e única) vez o mar, e moraram aí por menos de um mês.
Hahnemann tem alguns discípulos na arte da Homeopatia, e a eles recomenda que também manipulem eles próprios os remédios e os entreguem diretamente aos seus pacientes, por não confiar nos farmacêuticos. Esta atitude, logicamente, desagrada aos farmacêuticos.
Publica em 1800, aos 45 anos, um artigo no jornal Der Anzeiger, dirigido por seu amigo, o Conselheiro Becker, anunciando que descobriu e preparou um novo sal alcalino com propriedades terapêuticas, que pode ser entregue na própria casa do comprador, mediante pagamento. A Sociedade das Ciências Naturais de Berlim compra uma amostra, com o próprio selo de Hahnemann e a analisa, constatando que a descoberta trata-se do borato de sódio, o banal borax. Chamam Hahnemann para dar explicações, e chovem zombarias e insultos sobre o pretenso “inventor”. Um artigo escrito por um farmacêutico trata Hahnemann de “grande mistificador”, em outro é ressaltada a “inesperada imprudência desse Samuel Hahnemann”.
O Conselheiro Becker fica furioso com Hahnemann e este, por sua vez, reconhece seu erro num outro artigo publicado no Jornal de Química, alegando sua boa fé e, mostrando-se arrependido, informa que doará todas as quantias recebidas às obras de caridade de Leipzig. Além disso, apresenta suas desculpas numa carta aberta à população. O editor deste jornal, o Professor Scherer, toma a sua defesa num artigo publicado no jornal do Conselheiro Becker, invocando a honestidade e a retidão de Hahnemann e insistindo que tratou-se tudo de um erro técnico, dada a escassez de segurança que a recém-nascida Química ainda oferecia em seus resultados, que já enganara outros químicos famosos.
Logo depois deste episódio, Hahnemann publica um pequeno livro sobre prevenção e cura da escarlatina, que à época aparecia em epidemias fatais. A obra era vendida por uma moeda de ouro, pelo próprio autor, que junto entregava o remédio para o tratamento sem a identificação deste. Os farmacêuticos voltam à carga sobre Hahnemann, por pedir um pagamento antecipado e caro antes mesmo de iniciar qualquer tratamento e por não indicar a composição do remédio indicado no livro, que ele mesmo vendia. Para eles, é uma verdadeira fraude. Os colegas médicos unem-se aos farmacêuticos e agridem sua reputação profissional. O Conselheiro Becker, mal refeito do desgosto causado pelo episódio do borax, afasta-se de Hahnemann, e este escreve inúmeras cartas para reconquistar a confiança do amigo fiel. Revela seu segredo, sua fórmula e as experiências médicas sobre as quais apóia-se e publica em 1801, com a ajuda de Becker, um novo livro, de 40 páginas, chamado “Cura e Prevenção da Febre Escarlatina”. O medicamento que ele indica tanto para prevenir quanto para curar é a Belladonna, que ele utiliza de forma bem diluída, e mostrou ser extremamente eficaz, e foi reconhecido por isso posteriormente. Em 1825, o Professor Hufeland, editor do Jornal de Medicina Prática, publica um artigo intitulado “Efeito preventivo da Belladonna”, onde presta homenagem a Hahnemann. Em 1838 o governo da Prússia recomenda o emprego da Belladonna em doses muito diluídas na prevenção e tratamento das epidemias de escarlatina.
Escreve vários artigos entre 1801 e 1806 pregando o uso de substâncias baseadas na similitude de suas ações, e o uso de baixas diluições de medicamentos.
Em 1801, retorna à sua Saxônia natal, e vai morar em Machern, logo mudam-se para Eilenburg, seguindo-se Wittenburg e, finalmente, retorna a Dessau, onde conheceu sua esposa Henrietta.
Está com 47 anos, em 1802, e há 20 deixara Dessau para seguir uma vida de incertezas em que pouco exercera a medicina, dedicando-se mais a experimentos, traduções e escritos próprios. Sua família consiste de sua mulher Henrietta, 38 anos, sua filha mais velha chamada também Henrietta, com 21 anos, Frederico, 18 anos, Guilhermina, 16 anos, Amália, 15 anos, Caroline, 13 anos e Frederica, 9 anos. Neste período, desde a tradução da Matéria Médica de Cullen, onde experimentou em si mesmo a quinquina, vem experimentando em si e em alguns voluntários, as substâncias cujas propriedades medicinais ele quer conhecer.
Essas mudanças freqüentes são motivadas pela busca de uma situação financeira confortável, mas as guerras napoleônicas que alastram-se pela Europa o faz fugir de lugares que podem oferecer perigo à sua família. Por sua intransigência e falta de papas na língua, envolve-se em polêmicas com seus colegas médicos onde quer que vá, fazendo inimigos e enfrentando hostilidades, que muitas vezes atrapalham ainda mais a possibilidade de ganhar algum dinheiro. Hahnemann também gosta de viajar, de mudar de ares.
Em 1803, aos 48 anos, Hahnemann e sua esposa Henrietta são agraciados com mais uma filha, Eleonora.