A criança, ao nascer, ainda não tem o seu corpo pronto. Ela vai desenvolvê-lo até tornar-se adulta, mas os primeiros sete anos exibem uma mudança acentuada neste corpo. O sistema nervoso e os órgãos dos sentidos desenvolvem-se rapidamente. A criança é curiosa por natureza, aprende por imitação dos adultos, principalmente dos seus pais. O contato com a natureza permite conhecer o mundo em sua forma mais primitiva.
A principal atividade para a criança é brincar! Através das brincadeiras, uma criança aprende a relacionar-se com a natureza, com outras crianças e com os animais. Principalmente ela se diverte, expande sua alegria, encontra sentido em sua vida.
Cada geração, desde os anos 1960, limita mais um pouco a possibilidade das crianças brincarem. Primeiro foi a televisão, que chegou a ser chamada de babá eletrônica. Muito prático: você põe a criança em frente à TV, e desenhos animados e louras fazendo-se de animadas hipnotizam-na, raptando toda a sua atenção. A TV faz tudo, a criança não faz nada. Criatividade? Zero! Atividade? Zero! A criança sofre uma massificação de interesses, ideias e sentimentos pela ação das muitas horas gastas em frente à TV.
Vieram os videogames e houve um aumento na atividade, já que pelo menos os dedos se mexem… Contudo, a criatividade continua nula, pois a criança apenas reage ao estímulo provocado pelo videogame. Muitas mães de filhos hiperativos relatam que a criança só ‘se acalma’ com videogame. Na realidade, ele muda a cena e o estímulo continuamente e, como a criança hiperativa não consegue fixar a atenção e por isso fica agitada, a mudança permanente de estímulo do jogo acompanha os pulos que a sua mente sofre.
Por último, chegaram os computadores (e celulares, smartphones, e ainda vem mais coisa por aí). A criança navega na internet, joga, posta mensagens no Orkut. Parece maravilhoso! Só precisamos lembrar que tudo ali é virtual. O mundo real está lá fora, cada vez mais longe do alcance da criança. É preciso ir ao zoológico para uma criança dos anos 2000 saber o que é uma vaca, e que é aquele animalzão chifrudo e meio lento que produz leite, e não a caixinha!
Além dessas ‘diversões’ a criança tem compromissos: aula de inglês, judô, ballet, natação, e tudo que a imaginação possa inventar. O objetivo é ‘preparar a criança’ para o mundo, que é competitivo, cheio de compromissos. O mercado de trabalho hoje é duro, quase não há mais empregos, o empreendedorismo precisa ser estimulado desde a infância. Muitos argumentos! Só há um detalhe: para um adulto ser criativo no trabalho, ele precisa aprender a criar, e é na infância, através das brincadeiras, que a criança desenvolve sua criatividade, além de aprender a liderar e a ser liderado, a conciliar interesses.
Quando a criança brinca, alguém chama para a brincadeira, outros acompanham, ou não. Um inventa as regras, outros as seguem, ou as modificam. A criança ri, se irrita, sente medo de ser encontrada no píque-pega, corre da bola quando joga queimada. Ação real, decisões reais, emoções reais! Brincar é aprender a ser livre e a relacionar-se com os outros com igualdade e cooperação. Que as crianças brinquem mais, para termos melhores adultos!
Para saber mais, recomendo o texto brilhante de Valdemar Setzer sobre a influência da TV sobre as crianças: A TV Antieducativa.
Artigo originalmente publicado na Revista Personare