Querid@s amig@s,
A Antroposofia, bebendo da mitologia cristã medieval, fala da criação do universo como um ato de doação das hierarquias superiores, principalmente serafins, querubins e tronos, mas não somente eles. Esses seres espirituais altamente evoluídos participaram da criação de tudo que existe no universo (minerais, plantas, animais e seres humanos) doando sua própria substância, o que de certa forma os enfraqueceu. O nascimento de Jesus inaugura um novo tempo, o tempo em que nos tornamos responsáveis pelo destino de nossas vidas, do universo e também precisamos começar a retribuir o trabalho desses seres espirituais, que o tempo todo cuidam de nós.
E esta nossa missão está representada na manjedoura onde nasceu o menino Jesus, que logo recebeu a visita dos pastores da região e dos reis magos. Os reis magos chegaram até Jesus por meio de muito estudo e cálculos astrológicos, enquanto os pastores que cuidavam das ovelhas, foram avisados do nascimento do menino pelos próprios anjos. Duas formas de chegar ao mesmo destino, pelo conhecimento ou pelo amor e compaixão, agora unidos em torno do menino que ousou nascer para vivificar a Terra. Esta é a nossa missão como seres humanos: conciliar o frio conhecimento com o amor e a compaixão, criando a sabedoria, para tornar o mundo mais fraterno e facilitar nossa existência, mas também para nutrir o corpo etérico da Terra para que os seres das hierarquias superiores que nos deram tudo que ainda nem conhecemos possam se nutrir e se revitalizar. Este é o nosso compromisso com o mundo material e espiritual nestes tempos.
Feliz e sábio Natal,
Marcelo Guerra
O amor de Joaquim
O amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato. O amor comeu minha certidão de idade, minha genealogia, meu endereço. O amor comeu meus cartões de visita. O amor veio e comeu todos os papéis onde eu escrevera meu nome.
O amor comeu minhas roupas, meus lenços, minhas camisas. O amor comeu metros e metros de gravatas. O amor comeu a medida de meus ternos, o número de meus sapatos, o tamanho de meus chapéus. O amor comeu minha altura, meu peso, a cor de meus olhos e de meus cabelos.
O amor comeu meus remédios, minhas receitas médicas, minhas dietas. Comeu minhas aspirinas, minhas ondas-curtas, meus raios-X. Comeu meus testes mentais, meus exames de urina.
O amor comeu na estante todos os meus livros de poesia. Comeu em meus livros de prosa as citações em verso. Comeu no dicionário as palavras que poderiam se juntar em versos.
Faminto, o amor devorou os utensílios de meu uso: pente, navalha, escovas, tesouras de unhas, canivete. Faminto ainda, o amor devorou o uso de meus utensílios: meus banhos frios, a ópera cantada no banheiro, o aquecedor de água de fogo morto mas que parecia uma usina.
O amor comeu as frutas postas sobre a mesa. Bebeu a água dos copos e das quartinhas. Comeu o pão de propósito escondido. Bebeu as lágrimas dos olhos que, ninguém o sabia, estavam cheios de água.
O amor voltou para comer os papéis onde irrefletidamente eu tornara a escrever meu nome.
O amor roeu minha infância, de dedos sujos de tinta, cabelo caindo nos olhos, botinas nunca engraxadas. O amor roeu o menino esquivo, sempre nos cantos, e que riscava os livros, mordia o lápis, andava na rua chutando pedras. Roeu as conversas, junto à bomba de gasolina do largo, com os primos que tudo sabiam sobre passarinhos, sobre uma mulher, sobre marcas de automóvel.
O amor comeu meu Estado e minha cidade. Drenou a água morta dos mangues, aboliu a maré. Comeu os mangues crespos e de folhas duras, comeu o verde ácido das plantas de cana cobrindo os morros regulares, cortados pelas barreiras vermelhas, pelo trenzinho preto, pelas chaminés. Comeu o cheiro de cana cortada e o cheiro de maresia. Comeu até essas coisas de que eu desesperava por não saber falar delas em verso.
O amor comeu até os dias ainda não anunciados nas folhinhas. Comeu os minutos de adiantamento de meu relógio, os anos que as linhas de minha mão asseguravam. Comeu o futuro grande atleta, o futuro grande poeta. Comeu as futuras viagens em volta da terra, as futuras estantes em volta da sala.
O amor comeu minha paz e minha guerra. Meu dia e minha noite. Meu inverno e meu verão. Comeu meu silêncio, minha dor de cabeça, meu medo da morte.
MELO NETO, João Cabral de. Os Três Mal Amados. In: MELO NETO, João Cabral de. Poesia Completa. Rio de Janeiro: Editora Nova Aguilar, 1994, p.59.
Como você lida com regras?
Marcelo Guerra
No artigo anterior expliquei que a Terapia Biográfica pode revelar o sentido da vocação de cada pessoa. E mostrei as influências do primeiro setênio para a formação dos talentos que desabrocharão na vida adulta.
Agora vamos nos aprofundar no segundo setênio, que inicia-se por volta dos 7 anos, com a troca acelerada dos dentes de leite por permanentes e termina com o estabelecimento da adolescência, por volta dos 14 anos. Nele, a criança, que até então tinha como referência quase que integral a sua própria família, passa a dividir-se entre dois mundos: a casa e a rua, onde estão os amigos, a escola e a maior parte das brincadeiras.
Setênios
- A Terapia Biográfica estuda as fases do desenvolvimento humano dividindo-as em períodos de 7 anos, os assim chamados setênios, seguindo classificação de médicos/filósofos (os médicos também eram filósofos) da antiga Grécia.
Regras e normas
As brincadeiras, que antes tinham suas regras inventadas pelas próprias crianças, geralmente com frases começando por “faz de conta que…”, “finge que…”, nesta fase estão sujeitas a regras externas, como os jogos e os esportes. Brincar de pique, por exemplo, tem regras que vão passando de geração para geração. Jogar futebol ou queimada também tem regras que não se sujeitam ao “faz de conta que…”.
As normas também vão ficando mais fortes em casa e na escola. A criança já é maior, e dela se espera um pouco mais de responsabilidade. Essas normas vinculam-se aos ritmos e horários da família, por exemplo: ter hora para comer, hora para tomar banho, hora para dormir, hora para brincar, hora para estudar. Também são de grande importância as normas relacionadas à divisão entre os sexos, tais como “menina não senta de perna aberta”, “menino não chora”, e por aí vai.
São limites que representam necessidades sociais e os costumes de uma família, por isso variam de lugar para lugar e também em cada família. Os limites precisam ser justos, nem rígidos demais que façam a criança sentir-se acorrentada, nem frouxos demais, que a façam sentir-se com uma autoridade precoce (que ela não saberá usar e poderá prejudicá-la na vida adulta) sobre a própria família.
Autoridade e respeito
A criança encontra várias figuras de autoridade nesta fase, mas receberá uma enorme influência daquela que além de ter autoridade e merecer respeito, ofereça-lhe um tratamento acolhedor, carinhoso e cuidadoso. É dessa pessoa que ela se lembrará com frequência em sua vida adulta, quando estiver diante de situações, como escolhas éticas, em que precise tomar decisões que requeiram um comprometimento seu. Essa pessoa pode ser um familiar próximo, ou uma professora, uma vizinha. Seja qual for a sua origem, ela marcará a biografia dessa criança e será sua referência pela vida afora.
A maneira como uma criança recebe regras e normas se refletirá em sua vida adulta, tanto em âmbito pessoal e familiar, como no mundo do trabalho.
Trabalhar requer estar sujeito a várias regras, inerentes ao próprio trabalho ou ao relacionamento entre os colegas. Acatar regras cegamente pode ser a via mais fácil, mas certamente trará cicatrizes internas, pelos “sapos” que uma pessoa vai precisar engolir. É uma atitude herdada do primeiro setênio, quando a criança imita os adultos como forma de descobrir o mundo. Rebelar-se sistematicamente contra elas (que é a atitude predominante na adolescência) também é uma atitude extrema, que trará mais problemas do que soluções à vida do sujeito. Saber discernir o que pode ser aceito daquilo que se deve tentar mudar depende de ter recebido regras justas na infância.
A figura da autoridade amada pode ressurgir na vida adulta, desta vez como um tutor ou mentor, alguém mais velho e mais experiente que reparte sua sabedoria adquirida com um jovem que está começando. É uma simbiose, na qual soma-se à sabedoria de alguém experiente a vitalidade e vontade de um iniciante. É uma aliança que pode ser muito benéfica para ambos e para a empresa em que trabalham.
Saber respeitar regras sem dobrar-se a elas é um aprendizado difícil, mais ainda para quem recebeu uma educação ou repressora demais ou excessivamente liberal. Enquanto alguns pais e professores exigem uma obediência cega aos seus ditames, outros dão à criança ainda imatura uma autoridade que pode transformá-la em um adulto déspota, que não admite contrariedades ou frustrações.
Conciliar as regras com uma atitude empática, carinhosa e apoiadora permite à criança entender o objetivo das regras e desenvolver-se num adulto que sabe discernir o que precisa ser respeitado do que precisa ser modificado, com propostas e não com força, como aprendera pela convivência com uma autoridade amada.
Relembre essa fase de sua vida
- Você reconhece alguém que tenha ocupado esse papel de “autoridade amada” em sua vida? O que você admirava nessa pessoa?
- Como eram as normas recebidas em sua família?
- O que percebia como valorizado numa profissão pela sua família? Ganhar dinheiro? Ter sucesso? Realizar-se como pessoa?
- Como você sente que isso possa ter influenciado suas escolhas profissionais?
Artigo originalmente publicado na Revista Personare.
Viver com sonhos
Frescobol X Tênis
Depois de muito meditar sobre o assunto concluí que os casamentos são de dois tipos: há os casamentos do tipo tênis e há os casamentos do tipo frescobol. Os casamentos do tipo tênis são uma fonte de raiva e ressentimentos e terminam sempre mal. Os casamentos do tipo frescobol são uma fonte de alegria e têm a chance de ter vida longa.
Explico-me. Para começar, uma afirmação de Nietzsche, com a qual concordo inteiramente. Dizia ele: “Ao pensar sobre a possibilidade do casamento cada um deveria se fazer a seguinte pergunta: “Você crê que seria capaz de conversar com prazer com esta pessoa até a sua velhice?” Tudo o mais no casamento é transitório, mas as relações que desafiam o tempo são aquelas construídas sobre a arte de conversar.”
Xerazade sabia disso. Sabia que os casamentos baseados nos prazeres da cama são sempre decapitados pela manhã, terminam em separação, pois os prazeres do sexo se esgotam rapidamente, terminam na morte, como no filme “O império dos sentidos”. Por isso, quando o sexo já estava morto na cama, e o amor não mais se podia dizer através dele, ela o ressuscitava pela magia da palavra: começava uma longa conversa, conversa sem fim, que deveria durar mil e uma noites. O sultão se calava e escutava as suas palavras como se fossem música. A música dos sons ou da palavra – é a sexualidade sob a forma da eternidade: é o amor que ressuscita sempre, depois de morrer. Há os carinhos que se fazem com o corpo e há os carinhos que se fazem com as palavras. E contrariamente ao que pensam os amantes inexperientes, fazer carinho com as palavras não é ficar repetindo o tempo todo: “Eu te amo, eu te amo…” Barthes advertia: “Passada a primeira confissão, “eu te amo” não quer dizer mais nada.” É na conversa que o nosso verdadeiro corpo se mostra, não em sua nudez anatômica, mas em sua nudez poética. Recordo a sabedoria de Adélia Prado: “Erótica é a alma.”
O tênis é um jogo feroz. O seu objetivo é derrotar o adversário. E a sua derrota se revela no seu erro: o outro foi incapaz de devolver a bola. Joga-se tênis para fazer o outro errar. O bom jogador é aquele que tem a exata noção do ponto fraco do seu adversário, e é justamente para aí que ele vai dirigir a sua cortada – palavra muito sugestiva, que indica o seu objetivo sádico, que é o de cortar, interromper, derrotar. O prazer do tênis se encontra, portanto, justamente no momento em que o jogo não pode mais continuar porque o adversário foi colocado fora de jogo. Termina sempre com a alegria de um e a tristeza de outro.
O frescobol se parece muito com o tênis: dois jogadores, duas raquetes e uma bola. Só que, para o jogo ser bom, é preciso que nenhum dos dois perca. Se a bola veio meio torta, a gente sabe que não foi de propósito e faz o maior esforço do mundo para devolvê-la gostosa, no lugar certo, para que o outro possa pegá-la. Não existe adversário porque não há ninguém a ser derrotado. Aqui ou os dois ganham ou ninguém ganha. E ninguém fica feliz quando o outro erra – pois o que se deseja é que ninguém erre. O erro de um, no frescobol, é como ejaculação precoce: um acidente lamentável que não deveria ter acontecido, pois o gostoso mesmo é aquele ir e vir, ir e vir, ir e vir… E o que errou pede desculpas; e o que provocou o erro se sente culpado. Mas não tem importância: começa-se de novo este delicioso jogo em que ninguém marca pontos…
A bola: são as nossas fantasias, irrealidades, sonhos sob a forma de palavras. Conversar é ficar batendo sonho pra lá, sonho pra cá…
Mas há casais que jogam com os sonhos como se jogassem tênis. Ficam à espera do momento certo para a cortada. Tênis é assim: recebe-se o sonho do outro para destruí-lo, arrebentá-lo, como bolha de sabão… O que se busca é ter razão e o que se ganha é o distanciamento. Aqui, quem ganha sempre perde.
Já no frescobol é diferente: o sonho do outro é um brinquedo que deve ser preservado, pois se sabe que, se é sonho, é coisa delicada, do coração. O bom ouvinte é aquele que, ao falar, abre espaços para que as bolhas de sabão do outro voem livres. Bola vai, bola vem – cresce o amor… Ninguém ganha para que os dois ganhem. E se deseja então que o outro viva sempre, eternamente, para que o jogo nunca tenha fim…
São Gonçalo, com ajuda de Fernando Pessoa
Cheguei, finalmente, à vila da minha infância
Desci do comboio, recordei-me, olhei, vi, comparei
(tudo isto levou o espaço de tempo de um olhar cansado)
Tudo é velho onde fui novo.
(…)
Essa vila da minha infância é afinal uma cidade estrangeira.
Sou forasteiro, tourist, transeunte
É claro: é isso que sou.
Até em mim, meu Deus, até em mim.
Protegido: Uma visão sobre a passagem da infância para adolescência
Grupo de Terapia Biográfica em Belo Horizonte
Você passa a vida buscando um sentido para ela (a vida). Na maior parte do tempo, essa busca é fora, seja aderindo e vestindo a camisa de uma ideologia, comprando, jogando em outra pessoa a responsabilidade pela sua felicidade, e por aí vai. Geralmente quando você olha para dentro de si, esse olhar vai carregado de julgamento, ou admirando-se muito ou recriminando-se como se fosse o pior dos seres humanos que anda sobre a Terra.
Este é um convite para fazer parte de um grupo de Terapia Biográfica que vou coordenar na cidade de Belo Horizonte. O objetivo deste grupo é olhar, junto com os outros participantes, para a própria história, de forma clara e objetiva, sem julgamentos pré-concebidos, para chegar a uma imagem mais nítida de qual o propósito da sua vida.
Este grupo vai funcionar de forma contínua por 8 meses, em que teremos um grupo de discussão só para nós na internet, onde trocaremos mensagens e arquivos, indicações de sites, de livros, filmes, atividades. Uma vez por semana, às terças-feiras, 21:30h, teremos um encontro marcado pelo Skype, onde conversaremos com voz até 22:30h. Você organizará um caderno com fatos da sua vida junto com fotos e lembranças para tornar sua biografia algo vivo diante de você. E um dia por mês teremos um encontro presencial, de 9h às 18h, onde você poderá fazer atividades vivenciais como pintura em aquarela, modelagem em argila, danças circulares e contos de fadas, que ampliarão a compreensão do tema do mês, coroando as discussões com o contato real com o grupo. Para cada tema, teremos um filme para discutir (que assistiremos cada um em sua casa) e alguns textos e músicas para alimentar a discussão.
Nossos encontros presenciais e os temas que iremos abordar são:
- Infância e família, 27 de agosto de 2011;
- Adolescência e sexualidade, 7 de setembro de 2011 (feriado nacional, este encontro será em Casa Branca);
- Vocação e trabalho, 22 de outubro de 2011;
- Amor e relacionamentos, 26 de novembro de 2011 (este encontro também será em Casa Branca);
- Amizades, 17 de dezembro de 2011;
- Dinheiro, 28 de janeiro de 2012;
- Espiritualidade e morte, 25 de fevereiro de 2012;
- O mal e o perdão, 17 de março de 2012.
Para participar é necessário ter mais de 21 anos, ter acesso a um computador com conexão à internet e ter vontade de olhar para a própria biografia como quem olha para algo sagrado, que guarda as possíveis respostas para seus conflitos e indecisões.
O grupo, uma vez formado, será o mesmo até o fim do 8° encontro, por isso é importante refletir sobre seu real desejo de participar deste trabalho e evitar inscrever-se pelo impulso. O custo será de R$250,00 mensais, a 1ª parcela será paga através de depósito no Banco do Brasil ag. 0107-4 conta 20222-3 e as demais serão pagas no 1° encontro, com cheques pré-datados. O mínimo de participantes será de 6 pessoas e o máximo, 12. Se não houver o mínimo de inscritos até o 1° encontro presencial, o início poderá ser adiado. Informarei a quem estiver inscrito sobre o andamento das inscrições.
Os encontros presenciais serão na Clínica Diferencial, Rua Tomé de Souza 67 1º andar. Funcionários BH e Condominio Aldeia da Cachoeira das Pedras, em Casa Branca. Tels: (31)3227-0636 (31)3227-3014. O meu e-mail é marceloguerra@terapiabiografica.com.br .
Espero que estejamos juntos! Um abraço,
Marcelo Guerra
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Qual o destino do menino?
4º Motivo da Rosa
Não te aflijas com a pétala que voa:
também é ser, deixar de ser assim.
Rosas verá, só de cinzas franzida,
mortas, intactas pelo teu jardim.
Eu deixo aroma até nos meus espinhos
ao longe, o vento vai falando de mim.
E por perder-me é que vão me lembrando,
por desfolhar-me é que não tenho fim.