Arquivo da categoria: psicoterapia

Psicoterapia Antroposófica

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Linha alternativa de abordagem psicoterápica com base na filosofia criada pelo pensador austríaco Rudolf Steiner, no final do século XIX. Baseando-se nos estudos esotéricos da Helena Petrowna Blavatski e na teoria filosófica de Goethe, Steiner criou a Antroposofia suas inúmeras aplicações em todas as áreas do conhecimento humano (Medicina, Farmácia, Arquitetura, Engenharia, Dança, etc). A Psicologia Antroposófica foi uma lacuna deixada por Steiner e que passou a ser preenchida na segunda metade do século passado por autores como Rudolf Treichler e seu filho Markus Treichler, porém sem conformar-se ainda como uma teoria completa. Uma das grandes contribuições para o entendimento da Psicologia Humana é o estudo da Biografia. No Brasil, a médica alemã Gudrun Burckhart desenvolveu centros de estudo biográfico, como o Artemísia em São Paulo, onde pessoas se propõem a passar um final de semana ou um semana, revendo em grupo o curso de suas vidas. Como psicoterapia propriamente dita, a Antroposofia ainda conseguiu se definir até o momento. O que se vê é que existe uma tendência forte em unir as idéias antroposóficas à outras linhas pré-existentes, variando muitíssimo de terapeuta para terapeuta. Terapias coadjuvantes ligadas à Antroposofia podem ser muitos úteis, quando associadas a uma psicoterapia: Massagem Rítmica, Eurithmia Curativa e Terapia Artística, por exemplo. A própria medicação antroposófica (homeopática, fitoterápica ou alquímica) facilita muitíssimo o desenrolar do processo psicoterapêutico, seja em que linha for.

Artigo escrito por Dr. Bernardo Lynch de Gregório

Curso Biográfico em São Paulo

A Pesquisa Auto-Biográfica permite olhar para a própria história e expressá-la de diferentes maneiras (falando, escrevendo, pintando, dançando), ver o trajeto que percorremos na vida, como se olhássemos para a própria biografia do alto de uma montanha, o que traz uma visão panorâmica do sentido. E agora, para onde vou? Como corrijo o percurso para reencontrar o sentido da minha história? Quando sigo o fluxo do sentido, encontro paz interior, mesmo que tenha mais trabalho.

A síntese da programação é a seguinte:

informação sobre as fases da vida, as leis biográficas;

contato com o próprio corpo: danças circulares;

contato com o inconsciente: atividades artísticas (aquarela e colagem, a princípio), conto de fadas;

reflexão individual: a escrita da vida;

reflexão em grupo: contando a própria história;

eu hoje: identificando a minha pergunta;

pensando o amanhã: projetando metas para a minha vida.

Coordenação:

Rosângela Cunha

Psicóloga, Gestalt-terapeuta e Terapeuta Biográfica

Marcelo Guerra

Médico Homeopata e Terapeuta Biográfico

Formação Biográfica – Minas Gerais – Escola Livre de Formação Biográfica

Membro do International Trainers Forum em conexão com a General Anthroposophical Section of the School of Spiritual Science do Goetheanum – Dornach/Suiça.)

Onde e quando?

Em São Paulo, no Centro Paulus, de 14 a 17 de outubro de 2010.

4 parcelas de R$247,00 ou R$988,00 à vista, em quarto individual;

4 parcelas de R$292,00 ou R$1.168,00 à vista, em suíte individual.

A inscrição é efetivada com o depósito da 1ª parcela.

Escreva para rosangela@terapiabiografica.com.br ou marceloguerra@terapiabiografica.com.br para mais informações. Ou ligue para falar com um de nós: (11)6463-6880

VAGAS LIMITADAS

Faça sua inscrição online, clicando aqui.

RETRATOS DA VIDA – Panorama Biográfico em Nova Friburgo

A Terapia Biográfica tem o objetivo de encontrar sentido através da observação de fatos da própria vida, que são revistos de maneira objetiva, separando o que são fatos do que são sentimentos. A maior causa de sofrimento emocional ocorre por não percerbermos o sentido de nossas vidas. Com a Terapia Biográfica, reconstruimos o trilho que liga os fatos a um sentido ordenado.

Para isto, além de falar sobre os fatos, são realizadas atividades artísticas variadas, que permitem um suporte material para a memória, além de trazer um elemento lúdico que torna esta forma de terapia bem mais agradável. Nesta Vivência em especial, trabalharemos com imagens, principalmente de fotografias dos participantes, resgatando fatos e emoções. A arte faz a ligação do pensar com o sentir, através do agir, sem intelectualizações, quebrando as resistências ao processo da Psicoterapia. Assim, nos propomos metas de mudanças em nossas próprias vidas baseadas naquilo que nos é mais sagrado, nossa própria história.

Em Nova Friburgo, de 15 a 18 de janeiro de 2009, no Morgenlicht.

Coordenadores:

  • Rosângela Cunha

Psicóloga, Gestalt-terapeuta e Terapeuta Biográfica

  • Marcelo Guerra

Médico Homeopata e Terapeuta Biográfico

Escreva para santana@terapiabiografica.com.br ou marceloguerra@terapiabiografica.com.br para mais informações. Ou ligue para falar com um de nós:

(21)7697-8982, Marcelo

(32)8841-8660, Rosângela

VAGAS LIMITADAS

A Essência da Terapia Biográfica

Vivemos um tempo em que cada pessoa busca, com diferentes graus de empenho, compreender-se melhor como indivíduo. Frutos deste tempo são a psicanálise, a antroposofia, a teosofia, o humanismo, as diversas correntes psicoterápicas e a aproximação da filosofia com estas correntes

O ser humano tem hoje maior consciência de si do que em séculos passados, o que gera mais questionamentos. Nossas decisões deixaram de ser guiadas unicamente pela lógica das circunstâncias externas, e passaram a levar em conta nosso mundo interior, nossas aspirações, nossos desejos. Cada vez mais temos notícias de pessoas que largaram carreiras bem sucedidas em termos de dinheiro e prestígio, para dedicar-se a uma vida mais simples, mas que corresponde a uma busca interior de mais tempo junto às pessoas queridas, à possibilidade de dedicar-se a um hobby, ou a outro interesse qualquer que não diretamente ligado à profissão de origem. Exemplos deste movimento são executivos que trocam os escritórios por uma pousada numa praia escondida no litoral.

Nosso eu interior, nosso mundo interno, cada vez fala mais alto e exige mais respostas. As perguntas centrais são: “Quem eu sou, afinal? O que eu quero fazer com a minha vida? O que estou fazendo?” É aí que reside a importância da Terapia Biográfica. Porque não há melhor material para entendermos o que queremos das nossas vidas do que a história de nossas próprias vidas. Nossas questões essenciais em relação a nossas vidas só podem ser respondidas no contexto da vida em si. Pouco adianta confrontar nossas questões com teorias filosóficas ou mesmo esotéricas. O que traz respostas reais são os fatos da vida que levamos até aqui, como reagimos a eles, como os criamos, como os sentimos, como os transformamos em padrões, e porque não conseguimos sair destes padrões. Estas respostas são a chave para que, através do pensamento e do sentimento, possamos agir no sentido de modificar nossas vidas, tornando-as plenas de sentido.

Através do trabalho biográfico, o participante treina um distanciamento em relação à sua própria vida, como se a visse do alto de uma montanha, como uma paisagem. Com o prosseguimento do trabalho, é preciso criar um senso de responsabilidade por sua própria biografia, depois de entender pequenas frações da sua história, saindo do lugar de vítima das circunstâncias e tornando-se senhor(a) de sua própria vida. Através deste trabalho, uma pessoa pode sair da posição de deixar as coisas acontecerem a ela e assumir a direção de sua própria vida.

Este não é um processo fácil ou mágico, do tipo “vou fazer umas atividades numa tarde, relembrar algumas coisas e tudo vai entrar nos eixos.” Não, este é um processo que pode ser longo e cansativo, e geralmente nem um pouco fácil, em que se defronta com fatos que a pessoa preferiria deixar debaixo do tapete da memória para sempre, não fossem eles causadores de tantos outros sofrimentos e padrões de comportamento dolorosos. E quando você começa a trabalhar com estes fatos e compreendê-los, você pode chegar a escolhas para o futuro, totalmente baseadas na sua biografia. Esta é a essência da Terapia Biográfica: unir o passado, o presente e o futuro ao redor da questão de cada um, para que a pessoa possa tomar a vida em suas próprias mãos.

Marcelo Guerra

A Complicada Arte de Ver

>> Esta é a razão de ser da Terapia Biográfica: enxergar a vida com outros olhos, olhos de ver.

Ela entrou, deitou-se no divã e disse: “Acho que estou ficando louca”. Eu fiquei em silêncio aguardando que ela me revelasse os sinais da sua loucura. “Um dos meus prazeres é cozinhar. Vou para a cozinha, corto as cebolas, os tomates, os pimentões – é uma alegria! Entretanto, faz uns dias, eu fui para a cozinha para fazer aquilo que já fizera centenas de vezes: cortar cebolas. Ato banal sem surpresas. Mas, cortada a cebola, eu olhei para ela e tive um susto. Percebi que nunca havia visto uma cebola. Aqueles anéis perfeitamente ajustados, a luz se refletindo neles: tive a impressão de estar vendo a rosácea de um vitral de catedral gótica. De repente, a cebola, de objeto a ser comido, se transformou em obra de arte para ser vista! E o pior é que o mesmo aconteceu quando cortei os tomates, os pimentões… Agora, tudo o que vejo me causa espanto.”

Ela se calou, esperando o meu diagnóstico. Eu me levantei, fui à estante de livros e de lá retirei as “Odes Elementales”, de Pablo Neruda. Procurei a “Ode à Cebola” e lhe disse: “Essa perturbação ocular que a acometeu é comum entre os poetas. Veja o que Neruda disse de uma cebola igual àquela que lhe causou assombro: ‘Rosa de água com escamas de cristal’. Não, você não está louca. Você ganhou olhos de poeta… Os poetas ensinam a ver”.

Ver é muito complicado. Isso é estranho porque os olhos, de todos os órgãos dos sentidos, são os de mais fácil compreensão científica. A sua física é idêntica à física óptica de uma máquina fotográfica: o objeto do lado de fora aparece refletido do lado de dentro. Mas existe algo na visão que não pertence à física.

William Blake sabia disso e afirmou: “A árvore que o sábio vê não é a mesma árvore que o tolo vê”. Sei disso por experiência própria. Quando vejo os ipês floridos, sinto-me como Moisés diante da sarça ardente: ali está uma epifania do sagrado. Mas uma mulher que vivia perto da minha casa decretou a morte de um ipê que florescia à frente de sua casa porque ele sujava o chão, dava muito trabalho para a sua vassoura. Seus olhos não viam a beleza. Só viam o lixo.

Adélia Prado disse: “Deus de vez em quando me tira a poesia. Olho para uma pedra e vejo uma pedra”. Drummond viu uma pedra e não viu uma pedra. A pedra que ele viu virou poema.

Há muitas pessoas de visão perfeita que nada vêem. “Não é bastante não ser cego para ver as árvores e as flores. Não basta abrir a janela para ver os campos e os rios”, escreveu Alberto Caeiro, heterônimo de Fernando Pessoa. O ato de ver não é coisa natural. Precisa ser aprendido. Nietzsche sabia disso e afirmou que a primeira tarefa da educação é ensinar a ver. O zen-budismo concorda, e toda a sua espiritualidade é uma busca da experiência chamada “satori”, a abertura do “terceiro olho”. Não sei se Cummings se inspirava no zen-budismo, mas o fato é que escreveu: “Agora os ouvidos dos meus ouvidos acordaram e agora os olhos dos meus olhos se abriram”.

Há um poema no Novo Testamento que relata a caminhada de dois discípulos na companhia de Jesus ressuscitado. Mas eles não o reconheciam. Reconheceram-no subitamente: ao partir do pão, “seus olhos se abriram”. Vinicius de Moraes adota o mesmo mote em “Operário em Construção”: “De forma que, certo dia, à mesa ao cortar o pão, o operário foi tomado de uma súbita emoção, ao constatar assombrado que tudo naquela mesa – garrafa, prato, facão – era ele quem fazia. Ele, um humilde operário, um operário em construção”.

A diferença se encontra no lugar onde os olhos são guardados. Se os olhos estão na caixa de ferramentas, eles são apenas ferramentas que usamos por sua função prática. Com eles vemos objetos, sinais luminosos, nomes de ruas – e ajustamos a nossa ação. O ver se subordina ao fazer. Isso é necessário. Mas é muito pobre. Os olhos não gozam… Mas, quando os olhos estão na caixa dos brinquedos, eles se transformam em órgãos de prazer: brincam com o que vêem, olham pelo prazer de olhar, querem fazer amor com o mundo.

Os olhos que moram na caixa de ferramentas são os olhos dos adultos. Os olhos que moram na caixa dos brinquedos, das crianças. Para ter olhos brincalhões, é preciso ter as crianças por nossas mestras. Alberto Caeiro disse haver aprendido a arte de ver com um menininho, Jesus Cristo fugido do céu, tornado outra vez criança, eternamente: “A mim, ensinou-me tudo. Ensinou-me a olhar para as coisas. Aponta-me todas as coisas que há nas flores. Mostra-me como as pedras são engraçadas quando a gente as tem na mão e olha devagar para elas”.

Por isso – porque eu acho que a primeira função da educação é ensinar a ver – eu gostaria de sugerir que se criasse um novo tipo de professor, um professor que nada teria a ensinar, mas que se dedicaria a apontar os assombros que crescem nos desvãos da banalidade cotidiana. Como o Jesus menino do poema de Caeiro. Sua missão seria partejar “olhos vagabundos”…


O texto acima foi extraído da seção “Sinapse”, jornal “Folha de S.Paulo”, versão on line, publicado em 26/10/2004.

UMA ESCUTA ATENTA DA DEPRESSÃO

 

 

Uma tarde com James Hillman

por John Söderlund

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Esta entrevista foi traduzida mediante autorização de seu autor. O original em inglês pode ser acessado em newtherapist.com/hillman8.html.

 

Não, 90 por cento do tempo eu não permito que as pessoas me fotografem,” responde James Hillman bruscamente.

“Será que isto poderia ser parte dos 10 por cento,” eu me arrisco, dando um sorriso na direção do homem de aparência comum sentado na ponta de sua cadeira atrás da mesa, posicionada no centro do palco.

“Não, definitivamente não,” ele responde, bufando e desviando o olhar antes que o meu sorriso pudesse intervir para suavizar a pancada.
Eu me viro rapidamente, constrangido e furioso pela sensação de ter tomado um fora brutal, e sumo no meio dos dois mil ou mais membros da platéia que esperavam ansiosamente pelo discurso de Hillman.
Este é o piece de resistance no menu junguiano da Conferência Evolution of Psychotherapy de 2000, uma reunião de gurus da psicoterapia e alguns milhares de clientes bajuladores que vão beber até a última gota das palavras de seus “mestres”.

“Quem ele pensa que é,” eu resmungo para mim mesmo silenciosamente enquanto me sento no fundo do auditório e espero sua fala.

“A psicologia junguiana diz respeito, acima de tudo, à atitude,” ele começa. “Logo, o trabalho todo está em compreender esta atitude em direção à psique, ou à alma. A questão é: ‘O que é que a psique está fazendo ao apresentar o paciente com uma depressão?’”

Este é o Hillman clássico, brincando com o controverso e escorregadio tema da alma, com o qual mereceu um pouco de atenção recente no seu livro O Código do Ser. Escute relaxadamente e é atraente e empolgante. Preste muita atenção e ele apresenta mais buracos do que um queijo suíço, eu penso, ainda ferido.

“Ao invés de ver a depressão como uma disfunção, ela é um fenômeno funcional. Paralisa-te, acalma-te, deixa-te terrivelmente infeliz. Então você sabe que ela funciona,” explica Hillman, falando devagar e deliberadamente o bastante para um texto escrito à mão, transcrito palavra por palavra.

Você está fazendo uma ligação causal entre a epidemia da depressão no final do século XX e o estilo de vida que adotamos nas nações industriais do primeiro mundo, eu penso junto com algumas outras centenas de terapeutas extasiados?

“Se a história é meramente a repetição de uma estória, então não é necessariamente causal. Na visão de Jung, a causalidade é algo mais formal,” ele contra-ataca intuitivamente, desviando-se de um entendimento claro de onde está indo.

A consciência é “unilateral” na psicologia de Jung. Esta visão unilateral que retemos do mundo é complicada com a chegada de “outras partes”, continua Hillman, “aquelas deixadas do lado de fora da sala principal, que entram pela porta dos fundos.

E o que entrou, passou despercebido pela consciência, não está lá com a intenção criminosa típica de quem entra pela porta dos fundos, mas veio para perturbar o programa unilateral que a consciência tinha a intenção de perseguir. Este intruso é um agente de mudança a serviço da busca de sentido que vai além do sentido que a consciência pode nos oferecer, eu penso, enquanto Hillman dá uma pausa, permitindo aos seus ouvintes posicionar as peças desconectadas do quebra-cabeça em seus lugares corretos sem nenhuma peça de conexão. Mas as partes que faltam são facilmente posicionadas por sua platéia atenta, absorvendo-as.

“Os fatos acima mencionados são a essência da atitude junguiana para o que vem à tona na sua vida e na de seus pacientes,” resume.

A epidemia da depressão

Os jornais nos dizem que há muito mais depressão à nossa volta do que imaginamos, que ela é endêmica em nossa cultura, a maior reclamação apresentada na prática médica, nos diz Hillman novamente, resumindo alguns anos de estatísticas e projeções de saúde mental superficiais.

“Temos que fazer alguma coisa sobre a depressão!” ele diz, imitando provocativamente a principal resposta psiquiátrica aos pacientes que apresentam sintomas de depressão.
É claro, eu penso, relembrando algumas projeções recentes que acreditam que a depressão irá defasar a força de trabalho nas próximas duas décadas.

Um dos principais critérios diagnósticos para a depressão, aponta Hillman, é se sentir deprimido a maior parte do dia, praticamente todos os dias, durante duas semanas pelo menos.

“È o mesmo que colocar uma doença crônica na categoria de uma doença [?] aguda. Temos que perceber a natureza maníaca daquele diagnóstico, de que qualquer coisa que dure mais do que duas semanas em nossa cultura é longo demais”, ele diz.

“Esta é uma situação totalmente maníaca. Eu tenho que falar continuamente com vocês para vocês não se entediarem,” ele grita para a platéia. “Eu fico em frente ao meu fax, dou-lhe umas pancadas e digo: ‘Por que demora tanto para estas malditas coisas passarem?’” Soltamos uma gargalhada enquanto duas outras peças do quebra-cabeça de Hillman se encaixam.

O que a maioria dos americanos reclama é de não ter tempo suficiente nem sono suficiente. Maníacos não precisam dormir nem comer. Podemos nos sentar durante o dia inteiro na frente do computador, despenteados, nus como um doente em uma ala isolada do hospital. Então, onde é que a depressão, a lentidão, se encaixam? Como é que Saturno entra, a não ser forçando sua entrada?
A economia da depressão

O custo direto da depressão responde por apenas uma pequena parte das despesas médicas médias de uma pessoa, ele continua, mas nossa oposição frenética à depressão e o que isto representa tem uma grande semelhança em nossos temores econômicos dominantes hoje em dia.
Falamos de uma depressão econômica. Nos preocupamos com a crise de energia em termos econômicos e com a inibição da vontade em nossos pacientes. Ponderamos sobre a ameaça da poluição mundial enquanto nossos pacientes depressivos ruminam sobre suas fantasias de que seu interior está se tornando negro, de que estão sendo envenenados. Tememos o desemprego e a característica dominante dos indivíduos depressivos é que eles não conseguem levantar para ir trabalhar, aponta Hillman.

Duas vezes mais mulheres do que homens de todos os grupos raciais estão propensos a sofrer de depressão, ele continua.
“A cultura maníaca é fundamentalmente uma cultura da testosterona. Isto começou no século XIX, as mulheres eram as portadoras de uma enorme quantidade de sintomas, que elas apresentavam aos médicos”.

“Hoje em dia esta depressão ultrapassou os limites que tinha no começo da psiquiatria. Está na juventude, nas crianças, e o termo é usado muito amplamente. Mas é muito importante se voltar para que tipo de experiência aquela pessoa (que sofre de depressão) está passando.”

“Na prática, as pessoas dizerem que estão deprimidas é insuficiente, não é o bastante. Eu quero saber o que, onde, como, quais são os correlatos físicos, o que você come, o que acontece quando você está naquela cadeira e quando você se levanta da cadeira. Quero saber um monte de coisas sobre seu corpo.”

É saber o que aquela experiência depressiva está lhe dizendo como clínico, eu penso, se distanciando do diagnóstico e chegando ao âmago da experiência. Eu divago momentaneamente e penso a respeito do horário maníaco que mantenho há tanto tempo, relembrando como me sinto quando diminuo a velocidade por um minuto. Sinto-me bem por perceber o momento, eu penso, enquanto volto para a lista dos correlatos depressivos de Hillman.

“Cabelos secos, respiração curta, suspiros freqüentes, um tom diminuído ou nulo para tudo, sonolência e semblante sofrido, com uma seriedade diferente da ansiedade. Isto é muito importante. Tudo parece tão pesado, opressivo. Os romanos a chamavam gravitas, ela pertence a Saturno,” ele continua.

“Em seu treinamento você provavelmente escutou que a depressão é pior durante a manhã. Porque é que a depressão é pior durante a manhã? O que é que isto diz a respeito do dia no qual você está entrando? Será que é porque não tem um tom menor na música que tocam no rádio de manhã, porque você tem que acompanhar o nascer do sol? Temos que encontrar algum sentido nas coisas que observamos.”
Então, qual é o sentido que você encontra nisso, eu penso, ficando um pouco impaciente com o ritmo no qual ele está se movendo. Novamente, quase intuitivamente, Hillman sugere um intervalo e, na volta, liga um vídeo para passar um documentário britânico, entitulado “Kind of Blue”. Hillman é um dos primeiros entrevistados do documentário.

“Uma das coisas que você não quer ser é interrompido,” ele diz, agora com 6 metros de altura e em cores extremamente nítidas na tela, um vulto aparecendo gradualmente para a platéia.

“Você pode continuar, continuar, continuar na base de café e estimulantes. Quando você assiste os heróis na TV eles nunca se cansam. (Mas) a lentidão é básica para a noção de melancolia desde a sua primeira origem. A mania é com frequência descrita na psiquiatria como a ausência de tristeza. Perda significa perder o que se foi. Nós queremos mudar mas não queremos perder. Sem tempo para a perda não temos tempo para a alma,” ele diz retornando ao ponto.

“A melancolia nos leva a um lugar onde podemos ver mais claramente as essências da vida,” diz Jules Cashford, um escritor, ao entrevistador.

A alma conhece o caos da cultura em que vivemos. De alguma forma, se você não está de luto, você está desconectado do mundo. Então, a depressão subjacente é uma adaptação à condição obscura do mundo, explica Hillman. Toda vez que alguém cai em depressão todo mundo vem ressuscitá-lo, e temos as drogas e a terapia convulsiva para tratá-lo. Na vida comum, apenas nos levantamos e nos movemos novamente para evitar a depressão, ele continua.

O filme acaba, Hillman encolhe novamente ao seu tamanho normal e retoma a fala ao vivo. “Este filme foi considerado muito lento para a platéia americana, conseqüentemente, foi rejeitado pela PBS. Este filme pode ser parte da evolução da psicoterapia,” ele graceja, convidando o público às perguntas.

Um membro da platéia profere timidamente que ele luta para reconciliar o humanista existencial com o cientista nele mesmo quando se depara com um cliente deprimido. Será que eu ataco a depressão de uma maneira hábil ou me sento com as questões existenciais desconfortáveis que a depressão levanta?

A questão aborrece o Hillman impressionista: “Eu sugiro que você se sente com seu humanista existencial e seu cientista e que vocês três tentem chegar a uma conclusão,” ele retruca. O questionador se encolhe de volta em seu assento.

“Isto não é instrumentalismo, não é uma técnica que estou ensinando para vocês usarem. Vocês não vão persistir na esperança. Vocês vão manter a fé, e um dos caminhos da terapia que parecem mais úteis não é que você faça alguma coisa, mas que você mantenha o contato. Você é um acompanhante crônico, consistente, ao invés de ser um terapeuta que faz alguma coisa contra o problema,” ele diz.

“O que acontece é que você se torna ativado pelo silêncio ou a caída. Contra a paralisia existem os métodos super ativos de tratamento. A terapia eletroconvulsiva foi desenvolvida por um italiano que também desenvolveu fusíveis para aeronaves,” ele diz como que contando um segredo. “Na história do tratamento da depressão, havia o dunking stool (técnica de tortura onde se afogava a vítima), a purgação da bílis negra do intestino, tentativas de chocar o paciente. Todas estas tentativas representam o ódio ou a agressão contra o que a depressão representa no paciente.”

Mas Hillman não censura o tratamento du jour para a depressão – psicofarmacologia.

“Não existem razões para não tirarmos vantagem das medicações. O importante é a sua atitude perante isto, como você mantém aquele demônio em seu lugar para que não tome conta de você.” O truque, ele reitera, é manter o foco no que o paciente está sentindo, pensando, e imaginando.

“Não tenho a intenção de achar maneiras de acabar com a depressão. A depressão traz a lentidão, um movimento contrário à mania, intimidade. Ela abre a porta a algum tipo de beleza. Logo, parece haver algo lá dentro além da forma como você, o ego, enxerga,” ele conclui, completando uma imagem tosca e impressionista de um dos mais valiosos iconoclastas do mundo, que é muito mais valiosa do que aquela que pode ter sido apreendida pela minha câmera.

Tradução de Gustavo Gerhein

O Culto ao Corpo Segundo Jung

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“Não obstante, devo culpar-me de certa parcialidade, pois omiti o espírito do nosso tempo sobre o qual a maioria das pessoas se manifesta, pois é coisa evidente a qualquer um. Mostra-se através do ideal internacional ou supranacional, que toma corpo na Liga das Nações e em organizações análogas, bem como no esporte e, finalmente – o que é significativo – no cinema e no jazz. São sintomas bem característicos do nosso tempo, que estenderam o ideal humanístico ao próprio corpo. O esporte valoriza extraordinariamente o corpo, tendência que se acentua ainda mais na dança moderna. O cinema, como também o romance policial, tornam-nos capazes de viver sem perigo todas as nossas excitações, fantasias e paixões que tinham que ser reprimidas numa época humanística. Não é difícil perceber a relação desses sintomas com a situação psíquica. O fascínio da psique nada mais é que uma nova auto-reflexão, uma reflexão que se volta sobre nossa natureza humana fundamental. Por que estranhar então se esse corpo, por tanto tempo subestimado em relação ao espírito, tenha sido novamente descoberto? Somos quase tentados a falar de uma vingança da carne contra o espírito . Quando KEYSERLING denuncia sarcasticamente o chofer como o herói da cultura moderna, sua observação tem um fundo de verdade. O corpo exige igualdade de direitos. Ele exerce o mesmo fascínio que a psique. Se ainda estivermos imbuídos da antiga concepção de oposição entre espírito e matéria, isto significa um estado de divisão e de intolerável contradição. Mas se, ao contrário, formos capazes de reconciliar-nos com o mistério de que o espírito é a vida do corpo, vista de dentro, e o corpo é a revelação exterior da vida do espírito, se pudermos compreender que formam uma unidade e não uma dualidade, também compreenderemos que a tentativa de ultrapassar o atual grau de consciência, através do inconsciente, leva ao corpo e, inversamente, que o reconhecimento do corpo não tolera uma filosofia que o negue em benefício de um puro espírito. Essa acentuação das exigências físicas e corporais, incomparavelmente mais forte do que no passado, apesar de parecer sintoma de decadência, pode significar um rejuvenescimento, pois, segundo HÖLDERLIN: ‘Onde há perigo,surge também a salvação’.

JUNG, Carl Gustav. Civilização em transição. Tradução de Lúcia Mathilde Endlich Orth. Petrópolis: Vozes, 1993, parágrafo 195, capítulo IV, volume X/3 das Obras Completas.

Entrevista com a Dra. Gudrun Burkhard

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(Entrevista publicada no jornal Folha de São Paulo, suplemento Equilíbrio, em 25/1/01)

Quem é ela

Nome: Gudrun Burkhard.
Idade: 71 anos.
Profissão: Médica antroposófica, clínica-geral e terapeuta biográfica.
O que faz: Dá cursos de biografia humana para terapeutas e médicos no Brasil e na Europa.
Filosofia de vida: A cura das doenças só acontece quando o homem consegue mudar seus hábitos e harmonizar os lados intelectual e afetivo.

A idéia de que desequilíbrios da vida cotidiana contribuem para que doenças apareçam e influem na cura já foi incorporada pelo estabelecimento médico. Mas, quando se formou em medicina pela USP em 1954, a médica paulista Gudrun Burkhard teve de ir até a Suiça para estuda e como cabeça e corpo caminham lado a lado na busca pelo bem-estar. De lá para cá, Burkhard virou um dos gurus da medicina antroposófica no Brasil, fundou duas clínicas, escreveu 12 livros e formou dezenas de discípulos. Aos 71 anos, continua reclamando que a medicina clássica não enxerga o homem como um todo e insiste que mudanças de hábito são tão importantes para a cura quanto remédios de última geração. Leia abaixo os principais trechos da entrevista.

Folha – Como você entrou em contato com a Antroposofia?

Gudrum Burkahard – Quando me formei em medicina pela USP, em 1954, achei que precisava completar a formação clássica que havia recebido na faculdade. Nós tínhamos uma visão unilateral das doenças e da cura, sem considerar a individualidade de cada paciente, ignorando que o homem não era só um corpo físico, que ele também sentia, pensava e agia. Pouca gente na época dava importância à influência de fatores psicológicos no desenvolvimento da doença e na busca da cura. Fui, então, para a Suíça, onde havia uma clínica que já trabalhava com medicina antroposófica desde a década de 20. Fiz minha pós-graduação lé e, em seguida, voltei ao Brasil e comecei a atender em consultório particular.

Folha – Quem eram seus pacientes?

Burkhard – Eu atendia basicamente doentes crônicos, com câncer, esclerose múltipla, que não se sentiam satisfeitos com a resposta dada pela medicina clássica. Atuava também como clínica-geral, atendia do bebê ao avô. Em 69, fundei com meu marido a Clínica Tobias, só de medicina antroposófica. Lá, os pacientes crônicos ficavam semanas internados para revitalização e desintoxicação alimentar. Como o número de pacientes com estresse cresceu muito, abrimos outra clínica em 83, a Artemísia, para atender quem precisava de descanso e revitalização para resgatar a própria vida.

Folha – Como é o trabalho na Artemísia?

Burkhard – Os pacientes vão para lá para fazer o biográfico, que é um processo terapêutico no qual eles revêem seus passos de maneira que possam trilhar melhor o futuro. Também passam por reestruturação alimentar para desintoxicar o corpo e por outras terapias, como massagens e compressas.
Folha- A alimentação é tão importante assim?

Burkhard – As pessoas devem se alimentar de acordo com o estilo de vida que levam, e a dieta deve ser adequada ao trabalho. Não é tão importante quanto você come, mas o que come. Quem faz um trabalho mais intelectual não deve comer frituras nem carnes porque o organismo fica ocupado com a digestão e a cabeça não funciona tão bem. Essas pessoas devem comer grãos integrais e alimentos ricos em vitamina D e fósforo. Já quem trabalha mais com o físico deve adotar uma diética energética, abusar de massas e outros alimentos ricos em hidrato de carbono e com muita vitamina B.

Folha – Maus hábitos no dia-a-dia adoecem alguém?

Burkhard – Claro. Alimentação errada, falta de equilíbrio entre o lado afetivo e o profissional, uma vida cheia de conflitos, tudo isso influencia a saúde física do homem. Os desequilíbrios provocam distúrbios psicossomáticos, que podem resultar em estresse ou até câncer. A doença aparece para alertar que existe um desequilíbrio, e só o uso de remédios não vai resolver o problema. É preciso mudar os hábitos. Só que a maioria das pessoas ainda não se dá conta da importancia de os vários campos da vida estarem em harmonia. Tem gente que desenvolve muito o plano intelectual, mas deixa o sentimental de lado. Essa desarmonia cria espaço para que as doenças apareçam. Para ser saudável, é preciso descobrir se a pessoa obtém realização pessoal no trabalho, nas relações familiares, se ela tem tempo para fazer as coisas de que gosta ou se vive sempre em conflito.

Folha – Se a doença levar a hábitos mais saudáveis, então ela não é de todo ruim…

Burkhard – A doença é um alerta para mudar o ritmo do dia-a-dia. Fatores psicossomáticos afetam o corpo físico, a doença se manifesta, e a pessoa é forçada a dar uma parada obrigatória. O ideal seria que fizéssemos pequenas paradas espontâneas para ver como está a vida, mas ninguém faz isso. Quem leva uma vida cheia de desarmonia e não pára de vez em quando para corrigir o caminho que está trilhando termina sendo obrigado a parar quando a doença surge. Essa parada pode ser uma grande oportunidade para olhar para trás e ver o que está em desacordo com os desejos da pessoa.

Folha – E como se dá a cura?

Burkhard – O processo de cura começa com a busca do conhecimento interno, que é feito com o biográfico. Também damos aos pacientes a oportunidade de se expressarem pela pintura, modelagem, música. Cada um vai descobrindo aquilo que gosta, o que incomoda. O biográfico não é só uma forma de diagnóstico, é um processo altamente terapêutico. O autoconhecimento é fundamental para conseguir bem-estar e saúde. Você precisa conhecer as diversas paisagens por onde já passou para poder redirecionar o futuro adequadamente.